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22.2.07

A BARBÁRIE É A ETAPA FINAL DO CAPITALISMO

Buscando outra informação, reencontrei, por acaso, um post meu de 22/02/2007 (este aqui), que me fez perceber o quanto se assemelhavam as conclusões: 
— a que chegou o companheiro Dalton Rosado, a partir de suas análises econômicas na linha da corrente conhecida como Crítica do Valor, surgida no final da década passada e que obteve maior repercussão a partir da publicação, em 1999, do Manifesto contra o Trabalho, escrito por Robert Kurz, Ernst Lohoff e Norbert Trenkle; e
— as minhas, inspiradas na Escola de Frankfurt que, no século passado, buscou fundir Marx e Freud, ou seja, fez uma espécie de atualização das teorias marxistas à luz das descobertas da psicanalise e se tornou a grande inspiração dos contestadores de 1968, com Marcuse, Reich e Jung como principais referências (eu também aprendi muito com Norman O. Brown).

Ou seja, embora não haja unanimidade na física sobre se duas retas paralelas se encontram ou não no infinito, foi o que aconteceu com as abordagens minha (política) e do Dalton (econômica): por caminhos diferentes chegamos praticamente ao mesmo lugar. Verifiquem. (CL).
BARBÁRIE, A ETAPA TERMINAL DO CAPITALISMO
Inexiste forma ideal de se lidar com aqueles que já se tornaram bestas-feras, nocivos para si próprios e para a sociedade. Pode-se, quanto muito, controlá-los – e a um custo dos mais elevados para um país de tantas e tão dramáticas carências. 

Exterminá-los, jamais! Isso levaria a violência a patamares apocalípticos, pois os bandidos não teriam mais nada a perder. Nós, sim, perderíamos, ao abrirmos mão da civilização arduamente construída nos milênios que nos separam da horda primitiva, voltando à estaca zero. 

O xis do problema, no entanto, nunca é discutido: o fato de que a criminalidade é intrínseca ao capitalismo e subsistirá enquanto não substituirmos o primado da ganância e da competição pelo da solidariedade e da cooperação. 

Vivemos numa sociedade que:
desperdiça o potencial já existente para se proporcionar uma existência digna a cada habitante do planeta;
faz as pessoas trabalharem muito mais do que seria necessário para a produção do necessário e útil;
condena parcela substancial da população economicamente ativa ao desemprego, à informalidade e à mendicância;
estimula ao máximo a compulsão consumista sem dar à maioria a condição de adquirir seus objetos de desejo;
retirou do trabalho qualquer atrativo como realização individual, tornando-o apenas um meio para obtenção do vil metal (ou seja, uma nova forma de escravidão). 

Então, os que ainda têm emprego e os empreendedores continuarão irrealizados, esforçando-se demais para nunca obterem as gratificações almejadas, pois a lógica do capitalismo é perpetuar a insatisfação e mitigá-la com o consumo (a cenoura colocada à frente do asno para que ele continue puxando a carroça). 

Trata-se de um círculo vicioso perverso que faz a fortuna dos analistas, dos farsantes religiosos e dos picaretas da auto-ajuda. 

Alguns excluídos continuarão vivendo das esmolas dos programas oficiais e vão ajudar a eleger aqueles a quem convém mantê-los em eterna dependência. 

Outros tentarão obter pela força aquilo que jamais alcançarão pela competência. E servirão de espantalho para intimidar as classes superiores, fazendo-as crer que uma sociedade policial seria a solução. 

É paradoxal que, em nossa época, formidáveis avanços científicos e tecnológicos coexistam com uma regressão ao ambiente medieval, com os nobres entrincheirados em condomínios de alto padrão, circulando em veículos brindados e só podendo levar vida social em shopping centers, não ousando mais exporem-se fora de suas fortalezas. 

No exterior desses espaços fortificados e vigiados, os bárbaros estão sempre à espreita, prontos para desferir seus golpes. 

Foi, aliás, uma previsão terrível de Friedrich Engels, um dos pais do marxismo: quando uma sociedade consegue aniquilar as forças progressistas que poderiam levá-la a um estágio superior de civilização, acaba sendo destruída pela barbárie. 

O paralelo é com Roma, que venceu os gladiadores de Spartacus mas sucumbiu aos povos atrasados, condenando o mundo a séculos de trevas. 

Na ótica marxista, o capitalismo representou um estágio superior de civilização em relação ao feudalismo. No entanto, às vezes o "sistema" que já esgotou sua contribuição positiva é bem-sucedido em bloquear as forças de mudança. Foi o caso de Roma e está sendo o do capitalismo hoje.

Quanto a Roma, o que "pegava" era a escravidão. O passo seguinte seria reestruturar o Império a partir do trabalho de homens livres. E era a isso que levaria uma eventual vitória de Spartacus e seus gladiadores. Quando Spartacus foi derrotado, Roma e a escravidão entraram em lenta decadência, até que os bárbaros derrotaram o Império e o retalharam.

Então, voltou-se a um modo de produção bem primitivo: uma economia de base rural, um patamar há muito superado. Só a partir do mercantilismo se alcançou o estágio de desenvolvimento que a urbana Roma atingira. E a História passou a caminhar de novo para a frente.

Tanto o escravagismo quanto o capitalismo foram pujantes durante seus primórdios, para depois esgotarem sua contribuição e passarem a travar o desenvolvimento das forças produtivas. E atualmente é o capitalismo que cumpre esse papel de deter o progresso.

P. ex., se hoje o aparato produtivo se voltasse para o atendimento das necessidades sociais, ganharia um impulso formidável. Pensem quanto poderíamos evoluir se:
compatibilizássemos nossas atividades econômicas com o meio-ambiente;
direcionássemos as pesquisas médicas para a cura das moléstias e a descoberta de vacinas eficazes, em vez de investirmos principalmente em medicamentos que apenas prolongam a vida dos pacientes e amenizam seu sofrimento;
se nos lançássemos a um monumental esforço de educação em massa, imprescindível para que todos os cidadãos, sem exceção, se tornassem realmente civilizados.

Bem vistas as coisas, a história da humanidade foi até agora a história da luta contra a necessidade. 

Só no século 20 passaram a existir condições científicas e tecnológicas que nos capacitavam a produzir o suficiente para garantirmos uma sobrevivência digna a cada habitante do planeta. A possibilidade de atingirmos um estágio superior de civilização atualmente, é enorme. O problema deixou de ser a escassez, mas sim a adoção de prioridades erradas.

Ultrapassamos a barreira da necessidade e estamos prontos para ingressarmos no reino da liberdade. Só falta direcionarmos o potencial produtivo para o que é realmente necessário e útil: habitação, alimentação, vestuário, saúde, cultura, esporte, lazer.

Os homens poderiam trabalhar muito menos, viver muito bem e desenvolverem plenamente suas potencialidades. É tudo questão de mudarmos o foco. Para que precisamos de bancos, afinal? Das várias burocracias? Da propaganda que exacerba o consumo?

Escravidão e feudalismo não surgiram por mandamentos divinos. Resultaram de circunstâncias históricas e foram descartados quando as circunstâncias mudaram. O capitalismo também pode ser substituído por uma organização diferente da vida econômica e social.

É ultrajante que ainda exista tanta gente passando fome, tantos desempregados e subempregados. E que presidentes se elejam à custa dos currais eleitorais do assistencialismo mais retrógrado. Quanta sordidez e quanto sofrimento inútil!

Um comentário:

celsolungaretti disse...

Infelizmente, abri este post em 02/07/2022 para copiá-lo quase inteiro e aproveitá-lo no blog Náufrago da Utopia. Mas fiz uma trapalhada ao fechar tudo que havia aberto e acabei salvando aqui no blog O Rebate a versão de 2022 e não a de 15 anos atrás.

Enfim, o prejuízo não foi maior porque o que havia de intemporal nele permanece. Só ficou faltando a abertura, sobre um episódio policial mais chocante e a grita que provocou nas redes sociais, com muita gente clamando por penas mais severas.

Foi a isto que eu estava respondendo, ao repetir uma posição que já manifestara noutras ocasiões: a de que a criminalidade é intrínseca ao capitalismo e essas propostas inspiradas na Lei do Talião realmente não resolvem o problema.

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