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17.9.08

O RESCALDO DA GUERRA DOS FARRAPOS EVITADA

O pré-acordo ontem (16) firmado entre o presidente Evo Morales e os cinco governadores bolivianos rebelados veio ao encontro do que eu colocara no meu artigo de sete dias antes, Bolívia em Transe ( http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/2008/09/bolvia-em-transe.html ): “O melhor que podemos esperar (...) é uma solução de compromisso, com os dois lados da crise boliviana forçados a ceder para evitar-se o pior. Sendo a alternativa um genocídio, temos mais é de torcer para que a operação apaziguadora chegue a tempo”.

Os presidentes sul-americanos, surpreendentemente, mostraram-se à altura do momento, com destaque para o nosso Luiz Inácio Lula da Silva e a chilena Michelle Bachelet. Houve, sim, um massacre a lamentar-se, no departamento de Pando, cujos responsáveis têm de ser punidos exemplarmente. Mas, perdas humanas e prejuízos materiais foram irrisórios, diante dos que certamente decorreriam de uma guerra civil.

Foram insensatos e irresponsáveis os que apoiaram a via das armas, pois, vencesse quem vencesse, o resultado seria o mesmo: a desintegração de um país paupérrimo e sofrimentos atrozes impostos a uma população miserável. O isolamento político a que acabou relegado é um merecido castigo para Hugo Chávez.

Vejam o que ficou acertado:
1) o governo aceitou devolver às regiões a parcela do imposto sobre o gás que havia redirecionado para pagar pensão a idosos, e compromete-se a não mexer nas porcentagens de royalties das regiões;
2) o governo reconhece as autonomias administrativas de Santa Cruz, Pando, Beni e Tarija;
3) a oposição se compromete a desocupar todos os prédios públicos ocupados nas últimas três semanas e aceita ter como base da discussão o texto constitucional aprovado por constituintes governistas no final de 2007;
4) o governo suspende por um mês, prorrogável, a convocação dos referendos para promulgar a nova Carta.

Ou seja, Morales abusara do seu poder ao apropriar-se do quinhão dos governadores sobre as riquezas naturais extraídas em seus departamentos; ademais, relutava em conceder-lhes as autonomias administrativas que há muito já deveriam estar desfrutando.

A oposição, por sua vez, extrapolou todos os limites no combate às reformas políticas de Morales, incorrendo em práticas ilegais que configuravam rebelião e tendiam a desembocar num golpe de estado.

Então, o desfecho do episódio acabou sendo o melhor possível: cada lado recuou dos excessos que cometera. E não se derramou sangue por motivos fúteis.

Pois, no fundo, o que se tratava era uma disputa por bens materiais, não por valores ideológicos – mesmo porque é inimaginável a construção do socialismo num país tão atrasado (tentativas congêneres, na contramão da socialização das riquezas pré-existentes com que Marx sonhou, sempre geraram aberrações totalitárias).

Então, permito-me repetir a conclusão de outro artigo (http://naufrago-da-utopia.blogspot.com/2008/09/lula-brilha-na-cpula-da-unasul.html ) que escrevi no calor dos acontecimentos:

“...se o principal motivo dessa crise é a divisão da grana proveniente das riquezas naturais bolivianas (...), não vale a pena morrer gente. Com um pouco de bom senso, pode-se chegar a uma divisão desse bolo que seja aceitável para ambas as partes.

“Que os seres humanos se sacrifiquem por causas realmente nobres, como a construção de uma sociedade com liberdade e justiça social. Não por mesquinharias.”

2 comentários:

Cássio Augusto disse...

Com o recuo de Morales, quem perde é mais uma vez a parcela carente da população boliviana!!!

Anônimo disse...

Se lutar por algo que se acha justo, com medo de pagar o preço por essa luta, não fosse prática comum no passado, dois terços dos países do mundo não seriam independentes hoje, talvez o mundo falasse latim ou alemão em lugar de inglês como língua predominante ...
e viva a democracia, desde que não ofenda os intelectuais, ou os que se julgam com essa pretensão ..

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